29 de março de 2011

A solidão está dentro de mim (capítulo II)

Este texto, publicado aqui em vários capítulos é da autoria de Henrique Carvalhinho, auluno do 5ºB


CAPITULO 2


Assolado por pensamentos


Estava em casa atormentado, quando a minha mãe me chamou com a sua habitual voz serena. Mas aquilo era só a alma calma que eu queria sentir, pois quando a vi estava fula. Não sabia porquê, se calhar até sabia…Ela só podia estar a delirar, estava a gritar como se alguma coisa estivesse a cair do céu e nos atingisse a todos. Não, era algo pior, muito pior.

-Estás de castigo, chegar atrasado mas que história é essa? Para o quarto, já! Isto não é um pedido, é uma ordem! Vai, já!

Não tinha alternativa. Fui para o quarto, estava tão impressionado quanto ela, nunca nos tínhamos chateado. Mas há sempre uma primeira vês para tudo, não é? Mas agora o que mais me perturbava era o facto de não querer saber, como é que a minha mãe estava aqui, se me tinham telefonado a dizer que ela estava no Super Mercado.
Estava no meu quarto o que eu achava uma estupidez. Ao princípio era confortável mas depois, era insuportável, tão insuportável que … não sei, era uma sensação estranha.
Sentia um aperto no coração, o que era difícil para mim, porque nunca tinha sentido um assim tão forte. Estava horrorizado. Queria saber mais, queria sempre saber mais, isso para mim foi sempre um defeito, um defeito terrível, pelo menos um deles, não me importava, para mim isso era o menor dos problemas. Tinha outras coisas para resolver, muito piores.

Não queria saber. Se saísse daquela janela fora naquela plena noite ia acontecer o inesperado. Por isso o mínimo que podia fazer era dormir.

Mas porquê dormir? Porque é que não rabiscava no caderno? Assim dava asas à imaginação, muito melhor. Mas sempre me disseram que a dormir também se imagina. Por agora era a melhor opção, dormir. Acordei com a mente limpa, sem nada para dizer, não sabia se estava triste ou não, sentia-me bem, naturalmente bem. Só queria saber o que vinha a seguir, tinha medo de saber o que vinha a seguir, pois deixava-me sempre levar com aqueles ditados “A curiosidade matou o gato”.

Levantei-me, o que faço sempre todas as manhãs. Mas desta vez era diferente, muito diferente. Estava tudo do avesso, quer dizer nada me parecia igual: não ouvia a minha mãe a chamar os meus irmãos para o pequeno-almoço, o que não era habitual, nada habitual. Fui para ao pé da janela, uma árvore estava a mexer-se. Era o vento? Não, não era o vento, não havia vento. Era uma espécie de sinal, um sinal difícil de compreender, como se fosse alguém a tentar chamar-me.

Olhei para baixo, vi uma pessoa que rapidamente desapareceu. Não conseguia lembrar-me da árvore, desde pequeno que vivia naquela casa e não havia árvore, nenhuma árvore. Aquele dia não podia ser mais estranho: primeiro, a minha mãe não chama pelos meus irmãos, segundo, uma árvore a mexer sem vento? Só podiam estar a brincar comigo, aquilo não era normal, nem nunca foi, só queria tentar saber que sinais eram aqueles.

- Por que é que só me acontece a mim?! Estava irado e tão confuso que mandei para o chão o que queria que perdurasse para todo o sempre. A fotografia do meu pai, a única que tinha. Agora estava claramente amargurado e irado. Aquilo era a única coisa que fazia o meu coração pensar que a realidade que vivia era o sonho inexecutável. Mas essa ilusão tinha sido quebrada. Tinha voltado ao que era antes, solitário. Agora queria praticar o que nunca tinha sido praticado, nem ousado fazer, esconder o meu ser de todos os que amo e não amo, num sito ermo, longínquo. Isso era a primeira opção, a segunda era … ignorar tudo o que se tinha passado e continuar a minha vida nova, isolada, ou… descobrir os mistérios que a vida me ia deixando.

Imediatamente ouvi o grito do meu irmão, vinha do seu quarto. Fui até lá, não vi ninguém. Procurei em todos os recantos da casa. Nenhum rasto dele. Tudo o que eu mais gostava considerava-se desaparecido, destruído. Se não fosse aquela noite em que o meu pai desapareceu na lucidez das estrelas, logo ao meu nascer. Se não nascesse, nada disto teria acontecido. Mas porquê eu descobrir os enigmas da morte, da vida, a magia da lucidez das estrelas da noite?
Desde 3 de Abril, o dia em que nasci e, até agora, todos os anos nesse dia a solidão instala-se no meu corpo, fico com um ar pálido e o imprevisto acontece.
Na noite passada surgiu o que eu nunca teria pensado que ia aparecer. Estava desprotegido, não consegui controlar-me, chorei com muita vontade, jamais resistiria ao ataque da noite, pelo que mais temia.

No meu coração o meu pai ainda existia, mas não era a mesma coisa: antes sonhava com ele como nunca ninguém tinha sonhado, pensava que a aura dele viajava entre mundos para me ver. Essa certeza, tinha-me fugido.
O som instalou-se na minha cabeça.
-Não sejas perseguido, persegue…. Não sejas perseguido persegue…. Não sejas perseguido, persegue. Ouvi aqueles sons, pareciam a mensagem que ia desvendar tudo, todo o mistério que havia na minha vida. Mas aquilo não parecia nada, não havia palavra que explicasse o sentido perverso e contra verso da minha vida. Por isso decidi focar-me na árvore, na minha mãe, em tudo.

Ainda tinha de descobrir porque é que aquele homem estava no meu quintal logo neste dia, só neste dia, o dia depois do meu aniversário. Mas como é que ia encontrar aquele homem, se nem sequer lhe vi o rosto? Esperar pelo próximo 3 de Abril? Isso ia demorar uma eternidade.

Fui chamar pela minha mãe, não respondia. Sentei-me no chão em cima da carpete.

- Não… não… não… porquê eu? Por favor não me façam mal, por favor. Não me ponham esta vida, estou a pedir-vos! O vento entrou pela janela partiu o vidro, obrigou-me a largar a carpete. Sai pela janela, estava num tornado, não sentia as pernas, já não sentia o coração, os meus olhos fecharam-se, só havia escuridão.

Acordei, estava no meu quarto. Atordoado. Como é que tudo estava no sítio? Aquilo não tinha sido uma ilusão, era realidade, sentia-o nos meus ossos. Mas no meio da minha confusão mental, vi no chão um papel, li-o:
“ Não me tentes procurar, senão matar-te-ei quando menos esperares…”
Estava martirizado. Assustado. Ninguém queria saber de mim, alguns tratavam-me bem, mas em geral ninguém queria saber de mim. Queria desaparecer, queria morrer. Mas nada disso ia servir. Iam continuar a censurar-me, tinha de continuar a ignorar. Mesmo no oculto das almas iam-me tirar o pouco de coração, o coração que nunca devia ter tido vida.

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